Minhas Fotos - ( 2012 )
Lembro da trilha estreita que cortava a lavoura de tabaco!
Era da
largura da carroça, cujas rodas formaram dois profundos sulcos na terra
batida. Logo depois da pequena elevação dava pra ver a estrada maior, onde vez ou
outra passava algum carro. Andando alguns minutos entre campos e roças, lá
estava a pequena casinha, a beira da estrada.
Era muito pequena, mesmo! As paredes eram
feitas de tabuas grosseiras e com muitas frestas, e o telhado era coberto de
capim santa fé.
Os moradores da pequena casa eram dois seres
enigmáticos, pois ninguém da vila sabia ao certo como eles foram para ali.
Eram negros, e o que se dizia mais velho, era
tão velho que quase não se entendia o que falava, tinha uma voz um tanto
fanhosa e a falta de dentes dificultava ainda mais. O outro tinha o tamanho de
um menino de oito, nove anos mais ou menos, era surdo mudo e também muito velho!
Os dois passavam os dias ajudando o dono da terra
onde eles moravam, e nas horas de folga juntavam pinhão, pois existiam muitos pinheiros
naquela região. Ou então passeavam nas casas dos moradores. Minha mãe não
gostava quando eles apareciam lá em casa.
Eu tinha a maior curiosidade de ir à casa deles, porém todos botavam medo nas
crianças e qualquer travessura, lá vinha
a ameaça:
- Vou dar você para o Mantino e o Mudinho!
Assim, eram chamados!
Numa tarde de inverno enquanto perambulava
pelas estradinhas de terra com meus amigos imaginários, quando me dei por conta estava na frente da
casinha!
Fui caminhando bem devagarzinho, e fiquei parada
na pequena porta! Lá estavam os dois!
Essa imagem ficou na minha memória feito uma
fotografia!
No centro da pequena casa de chão batido, havia uma pequena fogueira. Sobre o fogo, uma panelinha de ferro pendurada, e os dois sentados num banquinho de madeira sem encosto, me
olhavam e sorriam!
Corri
os olhos pela minúscula casa! Contra uma
das paredes havia uma prateleira muito encardida com dois pratos esmaltados, duas canequinhas e um balde com água.
Em um dos cantos, algumas tabuas com um dos lados elevado, servia de
cama.
Mantino e Mudinho ficaram me olhando e sorrindo,
acho que sem saber o que fazer. Mudinho ria tanto que fazia um som estranho,
algo parecido a um gemido e Matino tinha um olhar doce, parecia envergonhado.
Entrei, sentei num tijolo que tinha do outro
lado da fogueira. O cheiro de fumaça era intenso!
Mantino levantou e pegou um dos pratos, retirou
alguns pinhões da panelinha preta e me alcançou. Coloquei o prato sobre as pernas e ficamos ali
os três, em silêncio sorrindo.
Comi e fui para casa!
Feliz, contei para
minha mãe que tinha ido passear na casa do Mantino! Ela ficou muito brava! Disse
para mim nunca mais fazer isso! Fez um monte de perguntas! E se não havia ficado
com nojo de comer lá. É claro que não!
Na época, não entendi porque minha mãe ficara
tão nervosa!
Imagine!
Uma menininha de sete ou oito anos, lá
no meio do mato com dois negros retardados!
Essa imagem era a que os adultos tinham deles.
O tempo passou!
Fiquei sabendo que a pequena
casa pegou fogo e os dois morreram carbonizados! Ou melhor, sumiram! Viraram
cinzas!
Ninguém nunca soube de onde eles apareceram!
Rezo para eles, às vezes!
Meus gnomos da
floresta!
Beijos a todos!
Jossara Bes.
Que história encantadora, Amiga!
ResponderExcluirE pensar que nos dias de hoje somos prisioneiros e reféns do medo. A inocência parece ter sumido, tal qual relatas como aconteceu com teus amigos, sumiu sem deixar vestígios e hoje não temos mais o prazer de desfrutar de uma vivência como essa que tens gravada em tua memória.
Os meus personagens, são dois idosos que moravam em uma casinha minúscula perto da casa da minha infância e se chamavam Dona Amália e Seu Tino, eram irmãos, e trabalhavam na horta e vendendo lenha cortada.
Saudades da Infância inocente!!!
Muito obrigada por despertares em mim essa lembrança adormecida.
Um beijo,
Oi Jossara,
ResponderExcluirAdorei a história e me fez lembrar que eu tb tinha os meus personagens infantis, como a Guilhermina (uma louquinha que andava com um saco imenso nas costas), o Coriolando (este maluquinho virou santo em Jaú), o Artur... acho que eram meus gnomos tb, só que eu era mais medrosa do que vc e não chegava perto deles nem a pau!
xoxo
Gosto disto!
São fatos como este que enobrece e torna cada infância uma infância singular,são fatos como este que mostra a pureza de uma criança, são fatos como este que mostra a distancia intelectual,financeira e social dos seres humanos, são fatos como este que revela o alto grau de cuidado materno com a sua cria,são fatos como este que mostra o grau da inocência infantil.Querida documentadora, parabéns,você reavivou na mente de cada leitor fatos parecidos, você conseguiu transportar o leitor para 08 anos e lembrar dos seus GNOMOS, nunca esqueço de SEU QUINCÓ,um velho negro de 84 anos,voz rouca e gutural,diz minha mãe que era fruto dos últimos escravos do Estado do Pernambuco,faleceu após morder propositadamente o focinho de uma cobra cascavel,dizia que tinha o corpo fechado, era isento e resistente ao seu veneno,ledo engano. Seu Quincó fez muita falta para as crianças ,era 1962, estava eu exatamente com 08 anos. Parabens mais uma vez.Solicito: continue a escrever fatos como este.Iderval.
ResponderExcluirFez-me lembrar tempos idos em que morei no Alentejo profundo.
ResponderExcluirFoi um ano e meio, mas deu-me para saborear quão importante é a solidão daquela gente.
No Alentejo, esses regos meios direitos, chaman-se embelgas; também só se via uma casinha ao longe e o terreno era uma planície.
Boas recordações.
Beijo
Estes me lembro bem e não tinha medo deles, eu e o ROQUE catavamos pinhão com eles hahahah...que show esta parte da infância vivi contigo como te digo teu olhar de poetisa é diferente do meu. bjuuus.
ResponderExcluirQuerida amiga hoje eu vim agradecer o carinho de sua presença no meu cantinho, assim que poder virei com mais calma.
ResponderExcluirUm abençoado fim de semana.
Abraço amigo
Maria Alice